Um Aronofsky by von Trier


O polêmico Darren Aronofsky (diretor de filmes como "Requiem Para Um Sonho", "O Lutador", "A Fonte da Vida", "Cisne Negro' e "Noé") nunca foi um dos meus preferidos mas me surpreendeu muito com seu mais recente, brilhante e controverso trabalho, "Mother".


Juntando textos bíblicos, Lars von Trier, um elenco poderoso e uma direção de arte primorosa, Aronofsy produziu uma verdadeira obra de arte falando sobre o papel da raça humana na destruição do planeta.
E como uma verdadeira obra de arte contemporânea, "Mother" vem sofrendo grande rejeição. O que realmente me espanta, já que a história, apesar da narrativa tensa e intensa, teoricamente é conhecida por grande parte do público.


 Assisti o filme em uma sala completamente lotada numa noite de domingo. O público acompanhou o filme em silêncio, como que tentando entender. Alguns desistiram no meio da história e era possível ver telas de celulares acesas em vários pontos.


Quando o filme acabou, voltando exatamente para seu início, 90% dos silenciosos expectadores se levantaram proferindo ofensas contra a película. Se sentiam ofendidos por não entenderem nada do que tinham acabado de ver. "Sem pé e sem cabeça" foi a frase mais ouvida após a sessão.
Realmente, para quem foi assistir a história de um casal que recebe a visita de estranhos e começa a vivenciar fatos bizarros, o filme é totalmente sem pé e sem cabeça. Mas o Gênesis e o Apocalipse estavam ali, bem na cara de todo mundo: Deus, a Mãe Terra, Adão e Eva, Abel e Caim, a maçã, Jesus e falas inteiras extraídas da bíblia.


E quem conseguiu estabelecer a relação da história com o que acontece de verdade com o planeta hoje, entendeu tudo! As relações humanas, a intolerância, o desrespeito, o fanatismo, a idolatria, a violência, as guerras, a destruição, o caos absoluto... e no meio disso tudo a vida e o amor tentando sobreviver.


A bíblia e dramas psicológicos são recorrentes nos filmes de Aronofsky, que tem formação em cinema e antropologia social. Mas "Mother" foge completamente a tudo o que o diretor fez anteriormente e mostrava um grande conflito entre o comercial palatável e o artístico duro de engolir, sem conseguir agradar nenhum dos dois públicos.
Em "Mother", ele assume o duro de engolir e se joga sem medo em um filme que pode ser o seu grande divisor de águas, marcando uma grande virada em sua carreira.


O elenco todo está impecável. Javier Bardem, surge sem sotaque e com uma interpretação precisa de um Deus frio e ao mesmo tempo fascinado pelo fervilhar das emoções e sentimentos. Ed Harris e Michelle Pfeiffer, foram escolhas perfeitas para o insólito casal Adão e Eva que faz a trama acontecer.
Mas a atuação de Jeniffer Lawrence, cada vez mais bela e mais surpreendente como atriz, joga "Mother" em um outro patamar. A força dramática e a delicadeza que a personagem exige, não seria encontrada facilmente em outra atriz da atualidade.


A riqueza de detalhes é outro ponto de destaque no filme. Sutilezas como a ferida que aparece nas costas do personagem de Ed Harris (referência clara à costela arrancada de Adão para a criação de Eva) e os 3 andares da casa que na última parte se transformam em céu, purgatório e inferno, são detalhes que tornam "Mother" um filme para querer ver de novo.


E acho que o Lars von Trier vai adorar, apesar do final esperançoso.

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